Eu te amo porque te amo.
Não precisas ser amante,
e nem sempre sabes sê-lo.
Eu te amo porque te amo.
Amor é estado de graça
e com amor não se paga.
Amor é dado de graça,
é semeado no vento,
na cachoeira, no eclipse.
Amor foge a dicionários
e a regulamentos vários.
Eu te amo porque não amo
bastante ou de mais a mim.
Porque amor não se troca,
não se conjuga nem se ama.
Porque amor é amor a nada,
feliz e forte em si mesmo.
Amor é primo da morte,
e da morte vencedor,
por mais que o matem (e matam)
a cada instante de amor.
…
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)
O jogo de palavras presente no título do poema (a assonância entre “sem” e “cem”) está diretamente relacionado com o significado da composição. Por muitas razões que tenhamos para amar alguém, elas serão sempre insuficientes para justificar esse amor.
O sentimento não é racional ou passível de explicações, ele simplesmente acontece, mesmo se o outro não merecer. O sujeito acredita que o amor não pede nada em troca, não precisa ser retribuído (“com amor não se paga”), nem pode ser submetido a um conjunto de regras ou instruções, porque existe e vale em si mesmo.
Comparando o sentimento amoroso à morte, declara que consegue superá-la (“da morte vencedor”), embora muitas vezes desapareça de repente. Parece ser esse caráter contraditório e volátil do amor que contém também o seu encanto e mistério.
Até mais!
Equipe Tête-à-Tête
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